sexta-feira, 11 de outubro de 2013

O ANJO BOM ( crônica)



O ANJO BOM (crônica )


O Anjo Bom
                                    Na viagem da vida eu seguia forte e leve com meus companheiros  e achava que os teria ao meu lado para  sempre. Acreditávamos nos mesmos sonhos, partilhávamos das mesmas histórias, ríamos juntos e chorávamos juntos.

                           Um dia, sem recado nem aviso ou placa, tive que descer bruscamente desse vagão de sonhos e realidades, tive que descer na estação e ficar ali sentada por longo tempo sozinha.  Olhei para o  horizonte e não havia  ninguém nem sol. Sobre minha cabeça,  as gotas do orvalho da noite que escorriam pelo beiral, pingavam em meus cabelos longos   sem vida, murchos de tristeza já  sem vaidade alguma. As gotas que escorriam pelo telhado escorriam pelo meu rosto, geladamente. Tudo parou. Não sabia mais andar nem falar. Meu corpo frio estava  apenas encolhido no banco de madeira. Como doeu aquele momento! Os companheiros estavam tão longe que não ouviam o meu grito de dor ou meu pedido de  ajuda. O trem não esperou. Ele se foi e foi cada vez mais longe, apressadamente sumindo por entre  a mata, as montanhas e as nuvens.

                              Assim,  procurei as flores de que tanto gostava ver  à beira do caminho e não as  vi, não havia nenhuma ali. O silêncio invadiu minha alma. Chorei. Chorei muito. Chorei tanto que pensava ser infinito aquele momento de morte. Parada, meditei e esperei pois as forças haviam ido embora na curva do caminho lá longe, no trem. A estação me prendeu, me amarrou com correntes fortes e invisíveis. Sofri.

                               Depois de muito estar ali, ouvi um  barulho ao meu lado. Olhei e nada vi. Novamente o barulho se repetiu e então delicadamente um Anjo sentou-se à minha esquerda . Aproximou-se mais. Docemente segurou a minha mão, soprou meu coração e beijou meus pés. Envolveu-me com todo o carinho de suas asas e colocou-me  em pé. Às vezes ele era branco, às vezes era negro, outras vezes azul, rosa e amarelo. Ficou calado. Nada disse. Ficou a me olhar por um bom tempo. Transbordava ternura... Caminhamos ali  por um tempo curto e longo, trouxe-me flores no pensamento, trocamos palavras mudas, sorrisos gostosos  e olhares puros. Então, eu já não mais andava, bailava no ar... Perguntas na mente me incomodavam. Queria eu saber de onde o Anjo viera. Por quê? Para quê?. Estivera ali para eu me  sentir forte para a nova viagem? Não sei.  Mistério. Só sei que  ele me ensinou a andar novamente de outro jeito e por outro caminho, sentindo o coração batendo nos dois lados do peito... Enxerguei um  caminho diferente, porém, bonito e com outras flores  que eu poderia vê-las e colhê-las. No entanto, ele se foi, partiu tão discretamente com o brilho da primeira estrela  do  anoitecer que mal pude ver seu vulto se levantando. Percebi isso porque senti um movimento suave ao meu lado e um leve bater de asas se afastando...sem barulho algum, baixinho, baixinho e depois para o alto se foi.. 

                         Por muito tempo pensei nos sinais silenciosos de sua chegada e de sua partida.Tempos depois aproximou-se um novo trem. Segui nele por outro caminho, o caminho que o Anjo mostrara para  eu viver e contar a minha outra história. Entendi naquele momento que havia chegado a minha  hora de voar. Tornei-me um Anjo também.

Ivete Luz

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